
Entre conventos: de Tuias ao Porto
Mais do dobro do que terá durado a efémera tentativa de promover um modo de vida urbano (séc. I – IV) num espaço que não oferecia as melhores condições para tal, durou a ligação destas terras a dois conventos femininos: Salvador de Tuias (c. 1140 – 1535) e São Bento de Avé-Maria do Porto (1535 – 1892).
O mosteiro de Tuias recebeu estas terras das mãos de D. Afonso Henriques, quando este ainda não se intitulava rei, mas apenas infante. Com efeito, nas atas das Inquirições de D. Afonso III, redigidas em 1258, os capelães Soeiro Peres, da igreja do Freixo, e Paio Anes, da igreja de Tuias, bem como as restantes testemunhas, referem-se à carta de couto do Mosteiro de São Salvador de Tuias – que incluía a igreja de Santa Maria do Freixo – a qual teria sido atribuída pelo infante D. Afonso [Henriques] a D. Egas Moniz “o Aio” e a sua esposa, D. Teresa Afonso. Essa carta seria, portanto, anterior a 1140.
Embora as testemunhas citadas nas Inquirições tenham assumido que jamais tinham visto tal carta – e que apenas tinham conhecimento da mesma por terem ouvido falar dela – a sua existência é-nos confirmada pela descrição dos limites do couto do Mosteiro de Vila Boa do Bispo, concedido pelo mesmo D. Afonso Henriques, já com o título de rei, a 12 de fevereiro de 1141. Nesta carta, refere-se claramente que o couto de Vila Boa confrontava diretamente com o de Tuias.
O Freixo manter-se-ia ligado a Tuias até à extinção deste convento, decidida por D. Manuel I em 1518, mas só concretizada em 1535. As freiras de Tuias foram transferidas para o Convento de São Bento de Avé-Maria do Porto, e com elas foram também as propriedades, incluindo toda a paróquia de Santa Maria do Freixo. Uma ligação que se manteve até que também o convento de Avé-Maria foi extinto, com a morte da última religiosa ocorrida em 18 de maio de 1892.
Protegidas pelos reis e não raras vezes transformadas em meras extensões dos domínios senhoriais, as instituições monásticas foram dotadas de extensas propriedades que nunca tiveram possibilidade de explorar diretamente, pelo que a opção quase sempre foi o emprazamento. Tuias e Avé-Maria não fugiram à regra. Mas o Freixo sim.
Com fracas terras, escassa água e gente muito pouca, a colina que na Idade Média se rebatizou com novo nome não tinha muito para oferecer se nela se procurassem bons campos agrícolas para arrendar. Não admira, pois, que os mais antigos prazos conventuais ignorem as terras mais altas do Freixo. Elas só começariam a produzir quando, séculos mais tarde, a iniciativa privada foi capaz de investir no arroteamento de terras incultas e improdutivas e na criação de socalcos naquelas pedregosas encostas. Porém, o Freixo, se na lavra era pobre, tinha outras coisas para oferecer, que as freiras, de Tuias primeiro, de Avé-Maria depois, bem souberam aproveitar. Tinha a igreja, que mesmo situada em local quase ermo, sempre continuou a atrair os fiéis. E tinha a feira, que não dependia de grande população residente para render. E render bem.
A igreja e a feira seriam, pois, muito mais do que os campos ou as casas, os dois mais preciosos bens de Santa Maria do Freixo. Não admira assim que, nos escassos documentos que chegaram até nós sobre o Freixo pré-moderno, não se trate de outro assunto que não das duas grandes preocupações das legítimas proprietárias das suas terras: dos principais momentos e sacramentos da vida dos seus habitantes, do nascimento à morte sempre ligados à igreja; e dos rendimentos da Feira da Quaresma, que durante muito tempo parecem ter constituído um verdadeiro seguro de vida para um lugar que de outra forma há muito estaria abandonado.